Conforme elucida Carlos Alberto Arges Junior, advogado especialista, as tecnologias preditivas, no contexto penal, referem-se ao uso de algoritmos e inteligência artificial para estimar comportamentos futuros de indivíduos, como a probabilidade de reincidência criminal. Esses sistemas baseiam-se em bancos de dados que reúnem informações sobre antecedentes criminais, histórico social, escolaridade, renda, entre outros fatores, e aplicam modelos estatísticos para “prever” se um réu tem maior ou menor risco de voltar a cometer crimes.
Em países como os Estados Unidos, ferramentas como o COMPAS (Correctional Offender Management Profiling for Alternative Sanctions) já são utilizadas para influenciar decisões judiciais, incluindo sentenças, liberdade condicional e medidas cautelares. A proposta, à primeira vista, é tornar o julgamento mais objetivo. Mas será que a objetividade algorítmica realmente existe?
Essas ferramentas são mesmo imparciais ou reproduzem preconceitos?
Apesar de prometerem neutralidade, os algoritmos não são livres de viés, explica o Dr. Carlos Alberto Arges Junior. Ao contrário, frequentemente reproduzem — e até amplificam — os preconceitos existentes nos dados de origem. Isso acontece porque os sistemas são treinados com dados históricos, que refletem desigualdades estruturais da sociedade, como o racismo institucional, a seletividade penal e a desigualdade social.

Quando um juiz baseia parte de sua decisão em uma “pontuação de risco” gerada por um software, há uma transferência de responsabilidade da interpretação jurídica para uma ferramenta que não pode ser questionada nem se explicar por completo. Essa prática desafia princípios fundamentais do processo penal, como a presunção de inocência, o devido processo legal e a individualização da pena.
Os réus têm direito de saber como essas decisões foram construídas?
Um dos principais dilemas éticos e jurídicos está na opacidade dos algoritmos. Segundo o Dr. Carlos Alberto Arges Junior, muitos dos softwares usados são proprietários, ou seja, suas lógicas internas — como pesos de variáveis e métodos estatísticos — não são acessíveis nem mesmo às partes envolvidas no processo. Isso fere o princípio da ampla defesa e do contraditório, pois o réu e seus advogados não conseguem contestar, de forma técnica, os critérios usados para rotulá-lo como “alto risco”.
No entanto, é possível desenvolver algoritmos auditáveis, com participação multidisciplinar, que permitam compreensão e contestação dos seus critérios. O uso ético dessas tecnologias também exige representatividade nos dados, mecanismos de correção de viés e políticas claras de responsabilização. Mais do que tudo, é necessário garantir que a tecnologia não se sobreponha à dignidade humana e aos princípios do Direito Penal garantista.
Qual o papel do advogado diante desse novo cenário?
O advogado se torna peça-chave na crítica e no controle do uso de tecnologias preditivas, pontua o Dr. Carlos Alberto Arges Junior. Cabe a ele não só dominar os fundamentos do Direito Penal e Processual Penal, mas também adquirir familiaridade com aspectos técnicos de algoritmos, inteligência artificial e análise de dados. Essa compreensão é essencial para contestar eventuais abusos, exigir transparência e garantir os direitos fundamentais dos acusados.
Além disso, os advogados têm a missão ética de provocar o debate público, atuar como guardiões das garantias constitucionais e evitar que a tecnologia seja usada como ferramenta de exclusão ou injustiça. Portanto, ainda falta regulamentação, preparo técnico, debate público e uma cultura jurídica crítica sobre o impacto da tecnologia no processo penal.
Por fim, para o advogado Carlos Alberto Arges Junior, a promessa de eficiência não pode obscurecer os riscos reais de automatizar decisões que lidam com a liberdade e a vida de pessoas. O avanço tecnológico é inevitável, mas isso não significa que deva ser aceito sem reflexão. O futuro da justiça penal passa, sim, pelo digital, mas não pode abandonar os princípios éticos e humanos que sustentam o Estado Democrático de Direito.
Instagram: @argesearges
LinkedIn: Carlos Alberto Arges Junior
Site: argesadvogados.com.br
Autor: Roman Tikhonov